Warren Buffett e Charlie Munger sempre foram críticos da diversificação de portfólios. Costumam dizer que é uma “proteção contra a ignorância”. Quem acompanhou a divulgação de resultados da Berkshire Hathaway no último dia 6 de maio, no entanto, não pôde deixar de perceber a desconcentração implícita do seu portfólio.

Buffet, de 92 anos, e Munger, de 99, percebem o real estado da economia norte-americana como ninguém. Foram claros em dizer que a maior parte dos seus negócios apresentará um lucro operacional mais baixo neste ano. Mesmo assim, esperam que o lucro da holding em 2023 seja superior ao de 2022. O motivo? Os juros recebidos sobre a enorme pilha de dinheiro que a Berkshire tem sob gestão devem compensar a perda de rentabilidade dos negócios ligados ao ciclo econômico. Nos últimos anos, Buffett e Munger vêm construindo, sem querer, um portfólio menos concentrado. Vítimas do seu próprio modelo de negócios, que gera caixa sem parar, não conseguiram escapar da diversificação.

A Berkshire Hathaway não paga dividendos. Seus negócios são fortes geradores de caixa, que fica acumulado na empresa. Toda terça-feira Buffett recolhe o saldo da semana anterior e compra títulos do Tesouro Americano. Na semana passada, comprou um papel rendendo 5,92% a.a. aproveitando-se do que chamou uma distorção do mercado provocada pela discussão sobre o teto de dívida americano. Nessa toada, a empresa fechou o último balanço com US$ 130 bilhões em caixa.

Tanto capital gera um daqueles problemas que qualquer um gostaria de ter: onde investir tanto dinheiro? A participação da empresa na Apple já é maior do que todo o negócio de energia do grupo, e segue crescendo sem que Buffett e Munger tenham que fazer absolutamente nada. Buffett, inclusive, classificou o investimento em Apple como o melhor negócio do seu portfólio: “A pessoa abre mão do seu segundo carro ou da sua segunda casa, mas não abre mão do seu iPhone”. Perguntado se está incomodado com o tamanho da sua participação na empresa, a resposta foi categórica: “Não”. E, na verdade, por que deveria? Cada dólar de variação no preço da ação da Apple gera um efeito de quase US$ 1 bilhão para cima ou para baixo no balanço da Berkshire, mas é uma gota num oceano de quase US$ 1 trilhão em ativos e US$ 500 bilhões de capital. Warren Buffett é o verdadeiro Tio Patinhas.

Com um capital que cresce a cada dia, a dupla alertou que os retornos futuros da Berkshire não serão tão espetaculares como já foram no passado: “Value investors terão de se acostumar com menos daqui para frente.” Quanto mais bem sucedido o modelo de negócios, mais caixa ele gera e mais desconcentrado fica o portfólio. E, como a velocidade de geração de capital é muito maior do que a capacidade de identificar oportunidades de investimento, a rentabilidade cai.

Para voltar a gerar retornos extraordinários, o capital disponível para investimento precisa ser menor. É de se imaginar, portanto, que a empresa pague dividendos no futuro, especialmente levando em conta que as várias instituições filantrópicas que herdarão o espólio dos bilionários vão precisar de fluxo de caixa para tocar seu dia a dia. A conferir. De qualquer maneira, o dilema da acumulação de capital é um problema bom de resolver. O acionista da Berkshire Hathaway agradece.