Soft, Microsoft. A gigante está leve como sempre. Mas nada micro. A companhia fundada em abril de 1975 por Bill Gates e Paul Allen sempre jogou no básico, desde o Basic, aquela linguagem popularizada por eles no mundo da computação pessoal. Básica no nome, que vem da simplista junção de ‘micro’computer + ‘soft’ware. Básica ao crescer também por aquisicões, comprando o PowerPoint. E o Hotmail. E o LinkedIn, a menos tóxica das redes sociais. E a Activision Blizzard (OK, esta anda dando trabalho e pode não se concretizar). E básica ao mergulhar na principal empresa de inteligência artificial (OpenAI), dona do badalado ChatGPT. Pois foi dessa forma, olhando a inovação pelo chão, que a empresa atingiu no mês de junho um preço de mercado recorde.

Na quinta-feira (15), seus papéis somavam a marca inédita de US$ 2,590 trilhões. Claro que investidores profissionais realizaram lucros e o market cap girava em US$ 2,453 trilhões na terça-feira (27). Nada que assuste.

A projeção é que as ações subam até dezembro. Em 3 de janeiro elas foram vendidas a US$ 239,58. A Coin Price Forecast estima o preço-alvo para o fim do ano em US$ 429,00 ­— alta de 79%. E isso tem tudo a ver com IA.

Inteligência artificial é o caminho

“Os modelos de inteligência artificial mais avançados do mundo estão se unindo à interface de usuário mais universal do mundo para criar uma nova era de computação”, disse Satya Nadella  chairman e CEO, ao divulgar os resultados do trimestre encerrado em março. O consolidado anual será divulgado no fim de julho.

A bem da verdade vale dizer que a performance da bigtech não foi solitária no segmento. De 2 de janeiro até 26 de junho, a alta do preço das ações foi de 46%. A Apple avançou 43%, Alphabet-Google (+35%), Amazon (+48%), Meta (+114%) e a nova queridinha, Nvidia (+173%).

No caso da Microsoft, de toda forma, o que impulsiona tudo é o otimismo do mercado sobre inteligência artificial.

Porque a companhia é vista, segundo reportagem da Reuters, como líder na adoção da tecnologia de IA. Em maio, começou a lançar atualizações da tecnologia para os serviços de nuvem do Azure, bem como para o mecanismo de busca Bing ­— ainda um tormento perto do Google. Mas… IA é IA.

Analistas do JP Morgan disseram que “continuamos a vê-la impulsionando o ressurgimento da confiança nas principais franquias de software”. Traduzindo: o dinheiro virá daí.

Para quem acompanha a companhia imaginada por Gates & Allen, nenhuma novidade. Judson Althoff, vice-presidente executivo e diretor comercial da Microsoft, escreveu um longo texto para tratar da junção de nuvem e IA. “É a modernização das operações na nuvem para aumentar a eficiência, reduzir custos e aumentar a segurança”, afirmou.

E citou exemplos em vários segmentos da indústria. Na Mercedes-Benz (“para oferecer o melhor atendimento ao cliente com o Mercedes Virtual Assistant”), na construtora austríaca Strabag (“com uma solução de gerenciamento de risco que melhora a eficiência operacional para economizar tempo e reduzir perdas financeiras”), na Unilever (“que se tornou uma empresa somente em nuvem”), no Grupo Campari (“que está criando conteúdo mais personalizado e informações mais aprofundadas sobre os clientes”).

Vai por aí. E termina sua postagem com um recado muito claro.

“A única maneira de navegar pela incerteza é por meio da inovação contínua e acelerada, e a própria Microsoft não é exceção. Vamos infundir capacidade de IA generativa em nossas ofertas comerciais.”
Judson Althoff, vice-presidente executivo e diretor comercial da Microsoft

Menu harmonizado

A grande sacada da companhia tem sido conceber uma espécie de menu harmonizado entre inteligência artificial e serviços em nuvem.

Na divulgação dos resultados corporativos de abril, a chefe de Finanças da Microsoft, Amy Hood, disse que espera um crescimento para nuvem no quarto trimestre de 26% a 27% ano a ano. Com 1 ponto porcentual vindo de serviços de IA. Isso em abril.

Cerca de 40 dias depois, em junho, ela estava ainda mais otimista. Numa conversa pública com o chefe de Tecnologia da Microsoft, Kevin Scott, afirmou que “a IA da próxima geração será um negócio de US$ 10 bilhões de crescimento, o mais rápido em nossa história”.

Foi a senha para os analistas do mercado acionário jogarem a projeção de preços dos papéis da empresa nas alturas.

Scott acelerou a projeção: “Como é realmente uma plataforma muito ampla, temos muitas maneiras diferentes de fazer os US$ 10 bilhões aparecerem”, disse em reportagem da CNBC. “Todos querem usar nossa infraestrutura, seja treinando seus próprios modelos, executando um modelo de código aberto ou fazendo API que construímos com a OpenAI.”

Poesia

Numa entrevista à Wired, o principal nome da Microsoft, Satya Nadella, não economizou elogios à nova tecnologia, que tem assustado gente de várias frentes. Perguntado sobre quando começou a ver o potencial do universo da inteligência artificial, ele respondeu que foi ao perceber os efeitos de escala. “Não treinamos [a IA] apenas em codificação, mas ficou muito boa em codificação. Foi quando me tornei um crédulo. Eu pensei: ‘Uau, isso está realmente acontecendo’ ”, disse.

O potencial da IA ainda está longe de ser dimensionado. Para o bem e para o mal, como acontece com qualquer tecnologia — para ficar em apenas um exemplo, o Prêmio Nobel é o Nobel porque um produto aniquilador fez a fortuna de Alfred Nobel…

Há dois meses e meio, Bill Gates afirmou que interromper as pesquisas e avanços em IA não resolveria seus potenciais usos colaterais. “Não acho que fazer uma pausa resolva os desafios”, disse.

Ele respondia indiretamente a várias frentes que temem pelo avanço incontrolado ou regulado da IA, tendo o bilionário Elon (Tesla-Twitter-SpaceX) Musk entre seus principais críticos.

“Claramente há enormes benefícios na IA. O que precisamos fazer é identificar as áreas complicadas.”
Bill Gates

Por ora, na Microsoft, ela só tem significado dinheiro e recordes.